Modelo Alessandra Tavares processa MC Lan por transfobia: “Me expulsou de clipe”



A modelo Alessandra Tavares, mulher transexual de 22 anos, tornou-se assunto nas redes sociais ao revelar os momentos de transfobia que viveu ao ser escalada para um clipe do MC Lan, homem cis de 25 anos que vem ganhando destaque no funk. Segundo ela, o cantor disse que não gravaria a obra com “um traveco”, chamando-a de “homem” e a expulsando do set de gravação.

Em entrevista ao NLUCON neste sábado (14), Alessandra conta que o episódio ocorreu no fim de 2017 e que está processando o cantor desde 2018. O processo é feito pela Defensoria Pública de São Paulo e pede uma indenização por danos morais. O valor não foi mencionado.

A modelo conta que foi selecionada para o trabalho após ser avisada por sua agência e enviar fotos para a produção. Ela foi convidada para uma seleção e, após ser aprovada e até participar de um almoço com a equipe, houve a confusão. Segundo Alessandra, tudo ocorreu pela reação do cantor ao vê-la no set e perceber que ela é uma mulher transexual.

“Percebi que estava todo mundo me olhando e ouvia termos pejorativos, como ‘traveco’, ‘homem’. Até que uma menina que também participava do clipe falou: ‘Ele está gritando homem’, mas ela não tinha se tocado que eu sou uma mulher trans e que ele estava se referindo a mim. Foi quando a produtora veio e falou para eu não gravar, pois o cantor não queria, e pediu para eu me retirar. Ele me expulsou do clipe”, afirma.

Alessandra afirma que, com o corte, pediu para a produção levá-la de volta até a estação de metrô mais próxima para que fosse para sua casa. Além de terem negado num primeiro momento, a produção teria disponibilizado um carro com dois homens. “Mas eles me deixaram logo na primeira esquina. Eu tive que descer, peguei um ônibus e me perdi. Demorei muito para conseguir chegar até a estação de Itaquera”, lembra.

PREJUDICOU CARREIRA

A modelo diz que foi a primeira vez que vivenciou um episódio explícito de transfobia no trabalho. “O que geralmente acontece é que, quando você passa por uma seleção, a contrante te olha de cima a baixo, desconversa e diz que você não preencheu o perfil. Você sabe que é transfobia, mas está nas entrelinhas. Neste caso, foi tudo muito explícito. Ele ficou falando ‘traveco’ e depois a produção veio dizer que ele não queria”, diz.

Ela revela que não chegou a comunicar a produção do cantor que é uma mulher transexual. Primeiro, porque é reconhecida legalmente enquanto mulher, pois fez a retificação dos documentos e tem o direito de participar de seleções de elenco feminino como qualquer outra mulher cis. Depois porque a seleção foi feita pessoalmente e, se não estivesse dentro de algum perfil esperado, a produção teria a oportunidade de reprová-la ou não. “Só não dá para me tratar como lixo e com transfobia, após ter sido aprovada, pois foi assim que me trataram”.


Por toda a confusão que ocorreu nas gravações, Alessandra afirma que foi bastante prejudicada em sua carreira. Ou seja, começou a ser vetada de outras seletivas e oportunidades de trabalho. “Eu chegava e eles diziam que não precisavam mais. Como era eu que bancava o aluguel de casa, porque trabalhava muito com evento, fiquei sem trabalho e nós fomos despejados. Eu, minha mãe e meus três irmãos fomos para a casa da minha vó e chegamos a dormir no chão por falta de espaço. Tudo isso prejudicou muito a mim e a minha família”, lamenta.

Além de modelo, ela declara que se formou em Artes Cênicas e em Jornalismo pela PUC-SP. Chegou a fazer uma ponta na série Carceireiros, da TV Globo, além de participar de programas da RedeTV!, bem como o Superpop.

FOTO COM A PABLLO

No início de 2018, MC Lan divulgou uma foto com a drag queen Pabllo Vittar e fez um discurso contra o preconceito. “Música não tem cor, sexo, nem raça ou credos. Estamos aqui para quebrar barreira. Deus nos ensina a amar a todos nós somos irmãos em fé. Todos tem o livre arbítrio para viver como quiser, e o Brasil precisa de mais amor e não de mais preconceito! Tenho vários fãs gays e eles merecem todo respeito do mundo (…) E para os homofóbicos de plantão? O funk não precisa de vocês. Pega seu preconceito e enfia no seu c…”.


Ver a foto de Lan com Pabllo foi uma surpresa para Alessandra, familiares e amigos que sabiam do episódio. “Uma amiga me enviou a foto e perguntou: ‘Não foi ele que te rejeitou?'”. Foi quando os amigos começaram a questionar o funkeiro nas redes sociais e, segundo ela, o cantor passou a responder de maneira pejorativa. “Ele disse que não era obrigado a preencher cotas, pois o clipe era para mulheres e eu sou travesti”, afirmou ela, cujas mensagens foram anexadas no processo como provas.

Alessandra chegou a comentar na postagem: “Nossa, que engraçado, você gravou com a Pabllo e me tirou do seu clipe”. Porém, segundo ela, ele teria bloqueado o perfil no Instagram, desativado os comentários e colocado uma foto de uma garotinha com câncer para mudar o assunto. “É exatamente aquilo que o pessoal fala: a pessoa é uma coisa em frente às câmeras e totalmente diferente por trás delas. Sobre a foto com a Pabllo, eu vejo a luta é pelo famoso pink money, já que ele sabe que ela é uma pessoa renomada e é a drag mais famosa do mundo”, afirmou.

Após a repercussão, Pabllo deixou de seguir ele, bem como a cantora Ludmilla – que revelou o relacionamento com a bailarina neste ano com Bruna Gonçalves – e que gravou recentemente um trabalho com o artista.

POR QUE SÓ AGORA?

A modelo afirma que demorou cerca de dois anos para falar sobre o caso na imprensa porque, inicialmente o processo da Defensoria se arrastou por vários meses até que ela conseguisse testemunhas e provas solicitadas, e depois porque nenhuma mídia televisiva se prontificou a abordar sobre o caso quando ela procurou.

Quem deu espaço ao caso inicialmente foi a jornalista Leonora Áquilla no quadro “Que Trans é Essa” em seu canal no Youtube. Ela prometeu levar o caso até o programa “A Tarde é Sua”, apresentado por Sônia Abrão.


Alessandra espera que Lan se pronuncie sobre o ocorrido e que haja justiça. “Não vou ser hipócrita de dizer que não quero receber a indenização por danos morais. Eu quero e ele deve uma resposta para toda comunidade, assim como o Nego do Borel fez (ao ser transfóbico com a Luisa Marilac e pedir desculpas). Espero que ele não banque o desentendido, pois não quero guerra”, diz.

O QUE LAN DECLARA?

Na entrevista à Leonora, Alessandra mostrou alguns prints de conversas privadas do funkeiro com algumas das pessoas que questionaram a transfobia. Lan teria declarado: “Não humilhei ninguém. E sei de quem você está falando. Simplemente não tinha um (sic) travesti no roteiro”, “Fiz um clipe para mulheres naquele momento”, “Não sou obrigado a colocar alguém no clipe simplesmente por COTAS. Não sou político”.

Em outra mensagem que seria encaminhado a Leonora, Lan afirma: “Sou filho de negros, mãe adotiva baiana, tenho gays e negros na equipe e na minha família, e meu melhor amigo é gay (…) Sou um homem íntegro e digno. Nunca humilhei ninguém e nunca menosprezei ninguém, até porque vim da rua e sou o MC que mais faz feat com artistas menores no Brasil. Ajudo muita gente e isso deveria ser observado. Jamais expulsaria alguém de um clipe até porque meu trabalho não é focar na modelo, quem escolhe modelo é a produtora, o casting. Eu só canto e faço clipe, não sou dos bastidores”.

A última foto no Instagram do artista, publicada há um dia, é de uma publicidade da marca Puma, em que ele pede para o seguidores marcarem amigos nos comentários. Contudo, todas as fotos estão com os comentários desativados.

Até o momento o MC não deu nenhuma declaração pública sobre o caso e, procurado pelo NLUCON, não deu um retorno até o momento. (Assim que conseguirmos ou a assessoria de imprensa do cantor quiser se preonunciar por meio do e-mail holtneto@gmail.com, atualizaremos a nota).

Fonte: NLUCON

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