Acuenda o Bajubá da PrEP e da PEP

 




Por: Ícaro Kropidloski

O assunto da segunda live do projeto Cidadania Travesti e Transexual** foi PEP e PrEP. Jovanna Baby recebeu a ativista Ludymilla Santiago, mulher trans e preta do Distrito Federal. Ludymilla é graduada em Comunicação Social pela Universidade Católica de Brasília, atua como educadora em Redução de Danos pela Fiocruz e integra espaços como a Associação do Núcleo de Apoio e Valorização à Vida de Travestis, Transexuais e Transgêneros do Distrito Federal e Entorno (ANAVTrans),  Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) e Fonatrans. Jovanna e Ludymilla lembraram da centralidade do HIV e da Aids no processo de organização política de pessoas trans e travestis, especialmente mulheres. “Costumo dizer que somos filhas da Aids, porque foi dentro dos projetos de Aids que nós nos organizamos politicamente. Mas as pessoas estão esquecendo disso” salientou Jovanna. Ao relembrarem questões como esta, envolvendo HIV e Aids, o foco da conversa naturalmente se encaminhou para os tópicos sobre PEP e PrEP, importantes estratégias de prevenção ao HIV e Aids. Confira abaixo as principais informações sobre estes tratamentos, aquilo que todes nós devemos saber.

Para relembrar, PEP é a profilaxia pós-exposição, um tratamento médico preventivo que deve ser iniciado até 72 horas após:

  • Uma relação sexual desprotegida, quando o preservativo não foi usado ou rompeu durante o ato.
  • Relações sexuais não consensuais, ou seja: violência sexual de qualquer natureza.
  • Acidentes com instrumentos perfurocortantes, como agulhas ou seringas, ou contato direto com material biológico. 

Já a PrEP consiste na tomada de comprimidos antes da relação sexual, medicamentos que permitem ao organismo estar preparado para enfrentar um possível contato com o HIV. Os públicos prioritários da PrEP são pessoas consideradas em maior vulnerabilidade, como:

  • Homens gays e HSH, sigla para Homens Que Fazem Sexo Com Homens.
  • Profissionais do sexo.
  • Homens e mulheres trans, travestis.
  • Casais sorodivergentes, quando um tem HIV e o outro não (lembrando que Pessoas que vivem com HIV , que estão em tratamento e possuem carga viral indetectável há mais de seis meses, sem outras ISTs, não transmitem o HIV). 


Neste sentido, Ludymilla destacou que a PEP é mais abrangente; embora demande uma rapidez maior na solicitação. Como vimos anteriormente, é necessário iniciar o tratamento com PEP até 72h após a exposição. E quanto antes começar com a medicação, melhor. Se as 72h recomendadas passarem, é aconselhável que não se deixe de fazer o teste rápido. Inclusive, a testagem deve ser recorrente, visto as janelas imunológicas de diferentes ISTs.  Já sobre o conceito de populações vulneráveis, a ativista fez uma provocação: “A gente também precisa fazer esse marcador de quem são as populações vulneráveis e quem são as populações ditas minoritárias, para pensarmos os acessos. A gente entende, por exemplo, que a população preta é uma população vulnerável, que tem alto risco de infecções. Mas a gente não é minoria dentro desse processo. Somos minoria política, mas não demográfica.” Ela salientou que é preciso, portanto, ressignificar espaços e terminologias para pensar o acesso, visto que, por exemplo, enquanto o nível de infecção por HIV diminui entre a população branca, ele aumenta entre a população negra. 

O tratamento da PrEP utiliza a combinação de dois medicamentos, por meio da ingestão diária de um comprimido. Já o protocolo da PEP dura cerca de 28 dias e utiliza dois comprimidos, com medicações diferentes. Tanto a PrEP quanto a PEP podem ser receitadas por médicos, enfermeiros e farmacêuticos. Em julho de 2020, o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) divulgou o parecer 12/2020 da Câmara Técnica de Atenção à Saúde (CTAS) sobre a prescrição de medicamentos PrEP e PEP por enfermeiros. Já em março de 2023, os farmacêuticos puderam voltar a prescrever as profilaxias pelo SUS. Essa flexibilização, do ponto de vista científico, se dá uma vez que PEP e PrEP são medidas preventivas e não predispõem de diagnóstico de alguma doença. Na prática, significa também maior acesso ao serviço e menos burocracia.

Medicamentos de PEP e PrEp fornecidos pelo SUS. Imagens: Geovana Albuquerque e Ludmila Souza

E onde é possível achar PEP e PrEP? Ludymilla sinalizou que  “geralmente, nos estados, (o acesso) é pelos serviços de maior abrangência e em espaços especializados. Então você deve procurar na sua cidade algum serviço especializado no combate e tratamento de HIV e ISTs.” Emergências, UPAS e Unidades de Saúde (os populares “postinhos”) são locais onde é possível ter informações e encaminhamentos para solicitar PEP e PrEP, nestes lugares há também distribuição gratuita de preservativos e gel lubrificante. Jovanna e Ludymilla fizeram coro a um ponto importante: prevenção combinada não significa que uma coisa exclui a outra. Ou seja, mesmo com PrEP é necessário usar preservativo e gel lubrificante.

PrEP por demanda e PrEP injetável, já ouviu falar? 

Ludymilla ressaltou que “a PrEP não vai resolver todos os problemas se a gente não entender que nossas vivências são complexas, com vários atravessamentos.” Um exemplo prático é a chamada PrEP por demanda, com diferentes indicações a partir de questões de gênero. Essa modalidade de tratamento antirretroviral consiste no uso dos medicamentos da PrEP no esquema 2 + 1 + 1. Toma-se uma dose dupla (dois comprimidos) entre 2 e 24h antes da relação sexual, um comprimido 24h após a dose dupla inicial e mais um comprimido 48h após a dose dupla inicial. São os mesmos comprimidos da PrEP regular, só muda o jeito de tomar.

Mas a PrEP sob demanda é indicada para homens gays e cis. Já para mulheres cis, homens trans e pessoas com vagina ela não é recomendada. Para esses grupos é necessário mais tempo de pesquisa para avaliar, entre outras coisas, o impacto da medicação no trato genital. Ludmilla explica que "estudos comprovam que ela (a PrEP por demanda) é muito eficaz com homens cisgêneros. Já com homens trans a gente ainda não tem nenhum estudo que mostre essa eficácia. Porque a mucosa vaginal leva mais tempo para reter medicação em níveis considerados altos para prevenção." É necessário ressaltar que a PrEP sob demanda não é o ideal para mulheres trans ou travestis que usam estrógenos, pois a interação do medicamento com os hormônios pode diminuir a concentração de PrEP e interferir na eficácia da medicação. Na dúvida, é necessário procurar uma unidade de saúde e conversar de forma franca com o médico. Assim, é possível entender se o seu perfil e estilo de vida se adequam a essa modalidade de uso da PrEP.

E para o futuro é possível contarmos com PrEP injetável, que está em fase de pesquisa e aprovações no Brasil. Ainda não há previsão para ela ser oferecida pelo SUS. Mas qual é a ideia? Uma injeção, com segunda dose quatro semanas depois e doses de reforço a cada dois meses. A PrEP injetável continua demandando que o paciente faça acompanhamento médico e testes regulares, mas busca melhorar a adesão ao tratamento. Atualmente, quem está nas linhas de frente dos serviços nota isso como um problema da PrEP oral, visto que o paciente precisa tomar a medicação com assiduidade, diariamente. Por isso, a opção injetável pode aumentar a adesão ao tratamento. É um assunto para ficarmos de olho, quanto mais opções, melhor. 

Acompanhe o projeto

Ficou com alguma dúvida? Confira as lives e acompanhe o Fonatrans nas redes sociais! 

Live 1 - HIV e Aids no Brasil com Karina Amorim

Live 2 - PEP e PrEP com Ludymilla Santiago 

**Este projeto é uma parceria do Fórum Black Trans Brazil - Fonatrans com o Departamento de HIV/Aids, Tuberculose, Hepatites Virais e Infecções Sexualmente Transmissíveis do Ministério da Saúde, com recursos do projeto BRA 15/004 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD).

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