Lei que proíbe ideologia de gênero nas escolas contribui para o aumento do preconceito, diz Jovanna Cardoso


A decisão tomada pelo desembargador do Tribunal de Justiça do Piauí, Ricardo Gentil Eulálio Dantas, suspende a lei municipal, aprovada por unanimidade pelos vereadores em Picos, em que proíbe a discussão de gênero nas escolas da cidade.
A Lei Municipal nº 2882/2018, que “dispõe sobre a proibição de atividades pedagógica que visem a reprodução de conceito de ideologia de gênero na grade de ensino da rede municipal e da rede privada de picos – Piauí, na forma da lei e dá outras providências”, possui a seguinte redação:
Art. 1º – Fica terminantemente proibida na grade curricular da rede pública e privada de ensino no âmbito do município de Picos a disciplina ideologia de gênero, bem como toda e qualquer disciplina que tente orientar a sexualidade dos alunos ou que tente extinguir o gênero masculino e ou feminino como gênero humano.
Art. 2º – O Chefe do Poder Executivo Municipal, no âmbito de sua competência, tomará medidas cabíveis para promover a divulgação da Lei, bem como, informar às autoridades competentes, bem como à Secretaria de Educação do Município e à Secretaria de Educação do Estado do Piauí e ainda às escolas particulares existentes no município.
Art. 3º – A Presente Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 4º – Revogam-se as disposições em contrário”.
Na decisão, o desembargador cita que as bases educacionais não devem ser determinadas pelo município, mas pela União.
“Numa análise perfunctória da causa, parece equivocada a disposição, via lei municipal, acerca de conteúdo curricular e orientação pedagógica nas escolas da rede municipal de ensino. De acordo com a Constituição de 1988, compete privativamente à União dispor sobre as diretrizes e bases da educação nacional (CF/88, art. 22, XXIV). Compete-lhe, ainda, estabelecer normas gerais sobre a matéria, a serem complementadas pelos Estados, no âmbito da sua competência normativa concorrente (CF/88, art. 24, IX). Cabe, por fim, aos Municípios suplementar as normas federais e estaduais (CF/88, art. 30, II)”.
De acordo com a presidente do Fórum Nacional de Travestis e Transexuais Negras e Negros (FONATRAN), sediado em Picos, Jovanna Cardoso, a decisão tomada pela Câmara de Picos aconteceu sem a presença dos movimentos que representam os LGBTs.
“Quando a lei foi aprovada em discussão só com segmentos religiosos e não discutiu com a parte prejudicada, a gente já entendeu que a lei era passível de nulidade. Na verdade, não só pelo fato de não ter discutido com a gente, enquanto movimento social, com as mulheres, com movimento de pessoas trans, mas ao fato de a lei em si já ser altamente inconstitucional, porque não se proíbe um professor de nada”, argumentou.
Jovanna  falou ainda que pautas como essas criam segregação e contribuem para aumentar o preconceito.
“Uma pauta como essa faz aumentar a violência contra a mulher, faz bombar a violência contra as pessoas transexuais, porque parte do princípio que essa população não tem direito a nada, não tem direito a ser conhecida, a ser respeitada e ela precisa ser execrada da face da terra. Leis como essa só contribui para que o feminicídio aumente alarmantemente, para que o transfeminicídio aumente, a LGBTfobia aumente em números incontroláveis. Leis como essa, presta um desserviço”, destacou.
A presidente do Fonatran afirma que há uma inversão de valores quando se coloca os segmentos de minorias como algo ruim.
“Eu sou uma cidadã, mulher transexual do município de Picos e presto um importante serviço para a sociedade na área de direitos humanos, na área de prevenção de ISTs, na área de direitos da mulher e em todas as áreas de benefício social. Eu presto esse serviço e sou uma mulher trans e quero, assim como os vereadores querem proteger as nossas crianças, eu também quero, só que a gente não pode proteger as nossas crianças cometendo esses equívocos, porque preconceito, gera preconceito”, defendeu.
A decisão:
À vista da argumentação aduzida, o Ministério Público, por seu
PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA, requer o seguinte:
  1. a) a concessão de MEDIDA CAUTELAR, com a imediata suspensão da eficácia da Lei Municipal nº 2882/2018 do Município de Picos/PI, por
afronta aos preceitos insculpidos nos arts. 3º e 217 da Constituição do Estado do Piauí; e
  1. b) em final julgamento, que seja reconhecida a procedência da pretensão deduzida, mediante a declaração de inconstitucionalidade material da Lei Municipal nº 2882/2018 do Município de Picos/PI, por afronta à Carta Estadual.
CONFIRA A DETERMINAÇÃO DOS ÓRGÃOS COMPETENTES
Fonte: Grande Picos

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